As Sombras
O sono era conturbado. Mexia-se
na cama, retorcendo os lençóis, gemeu assustado, transpirava. Por um momento, encolheu-se
como se algo estive diante de si, oferecendo-lhe um grande perigo. De repente,
viu-se sentado em uma cadeira, as mãos sobre o colo. Estava escuro, e a única
luz vinha de uma janela à sua frente, cuja vidraça estava quebrada.
Era um salão enorme, e
o silêncio era aterrador. Sentiu um calafrio ao ver vir da esquerda uma sombra.
Mas não conseguia ver onde estava a pessoa que a projetava. Era como se a
sombra fosse viva por si só, e sua existência não necessitasse de alguém.
— Lembra-se de mim? —
uma voz ecoou no salão, e ele sabia vir da sombra, mas não respondeu. Não sabia
o que precisava lembrar. Não ainda. Outras duas sombras surgiram. Uma veio da
direita, e a outra estava atrás dele, pois pôde vê-la no chão diante da
cadeira, e esta acenou para ele.
— E de mim, você lembra?
— pergunta a que estava atrás dele.
Tentou virar-se, mas
não conseguiu. Era como se algo lhe travasse o corpo.
Inúmeras sombras
começaram a surgir, vindas de todos os lados, e todas traziam consigo a mesma
pergunta: “Lembra-se de mim?”.
Ele não sabia ao certo
do que deveria se lembrar ou o que cada uma daquelas sombras, que começaram a
surgir aos montes, era de fato. Cercado por elas, sentiu-se em um julgamento. A
cabeça latejava, e a dor intensificou quando as sombras começaram a dizer,
todas ao mesmo tempo, coisas desconexas, e era como se não fossem elas que as
diziam, mas sim ele. Levou as mãos às orelhas, na tentativa de se livrar do som
daquelas vozes e debruçou-se sobre o próprio colo. Chorou de agonia e dor.
Instantes depois, o
silêncio reinou. Era como se ele houvesse tomado um forte analgésico para uma
dor intensa, que aos poucos foi cedendo até sumir por completo. Erguei a cabeça,
mas não ousou abrir os olhos. Manteve-os fechados por longo tempo. Quando teve
coragem de abri-los, deparou-se com dezenas de sombras, uma ao lado da outra,
feito soldados. Mesmo sem poder enxergar os olhos delas, sabia que elas o
encaravam, oprimiam-no, faziam parte dele de alguma forma.
— Perdão! — foi a única
coisa que conseguiu dizer dessa vez. Algo dentro dele, direcionava-o exatamente
para o ponto para onde deveria seguir. — Perdão. Eu… eu não…
— Sim, você quis dizer! — as sombras proferiam
em uníssono. — E estamos aqui para lembrá-lo disso.
— Por que sabia que ia
ofender, mas não… não era o que eu pensava.
— Mas disse — a voz era
uníssona —, e estamos aqui pra te lembrar do nosso poder devastador sobre você
e sobre quem nos ouviu.
Ele se remexeu na cama.
Algo o fazia ter a noção de que tudo era um pesadelo monstruoso, do qual queria
acordar, mas por algum motivo alheio ao seu entendimento, não conseguia. Chorou
encolhido feito um feto, puxando o lençol como se pudesse proteger-se com ele
do medo e do arrependimento e, sobretudo, das consequências ruins que seus atos
lhe trouxeram, mas era tudo em vão: o pesadelo não o deixava sair.
— Perdão! — insistiu. —
Por favor!
Por longo tempo, ele só
pode ouvir o som do próprio choro. Abaixou novamente a cabeça sentindo-se
impotente diante daquelas sombras. Quis dormir dentro do próprio pesadelo e
nunca mais acordar. Sons de passos ecoaram no salão. Ele ergueu o olhar. As
sombras, uma a uma, foram abrindo caminho. O som dos passos foi ficando cada
vez mais próximo. Enfim, ele pôde ver a silhueta de uma pessoa, e não era uma
sombra. Havia cores em suas vestes. Era uma mulher, e ela veio até diante dele,
as sombras abrindo caminho sempre. A mulher se abaixou diante do homem e o
olhou nos olhos. Ele chorava. Ela o encarou por longo tempo sem dizer palavra.
— Me perdoa! — pediu ele, rompendo o silêncio com um
timbre de voz fraco, triste.
Ela no momento nada
disse.
— Por favor…! —
insistiu ele.
Ela segurou-lhe as mãos
nas suas sem desviar o olhar, e sem dizer palavra. Ficou de pé e o fez fazer o
mesmo. Dessa vez, ele conseguiu levantar-se. Ela continuou a olhá-lo nos olhos.
Ele crispou os lábios, não havia mais o que dizer. Só queria sair do pesadelo.
Ela se aproximou mais e o abraçou. Nesse momento, todas as sombras, uma a uma,
começaram a sair do salão. A escuridão, aos poucos, foi dando lugar à
claridade. A luz se sobrepôs às trevas e, no abraço, ele sentiu-se perdoado.
O poder do perdao faz as sombras da alma(emoçoes,intelecto,desejos,pensamentos,sentimentos etc) sumirem e apavora as sombras espirituais das regioes das trevas
ResponderExcluirPois as sombras sabem que quando se perdoa o proximo e a si mesmo,o PAI das luzes vem ao encontro e ao abrir o coraçao pra ELE as trevas se dissipa
Pois perdoar é obra da luz e a sombra nao subsiste na luz
Esses pequenos textos sao interessantes
Muito bom
Grato, meu querido, por comentar. Bem isso mesmo! Saber perdoar é divino, e saber perdoar a si próprio é algo inexplicável.
ExcluirPerfeito
ResponderExcluirObrigado por ler e comentar.
ResponderExcluirainda bem que ele tinha alguém para abraçar..imagine só..o que teria acontecido..Belo texto!
ResponderExcluirSim, e recebeu o perdão. Obrigado por comentar.
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