Histórias Passageiras
A vida é feita de coisas
estranhas, de pessoas estranhas e de fatos estranhos. É tanta estranheza que eu
começo a me estranhar também.
Há anos pego este mesmo
ônibus para voltar para casa. É raro eu tomar outro, mas isso acontece, e é
sempre quando o professor nos segura até mais tarde na sala de aula ou quando
nos libera mais cedo. Sempre me sento nos últimos bancos, não sei por que
razão, pois balança muito, e isso me incomoda um pouco.
Hoje é a última vez que vou
voltar para casa neste coletivo, ou melhor, pode acontecer de eu pegá-lo outras
vezes, mas não rotineiramente como fiz durante esses três anos que durou o meu
curso na Universidade.
A maioria das pessoas que
está neste ônibus nem se conhece, mas tenho certeza de que cada uma delas
carrega consigo uma história. Tem um homem que sempre senta na frente, numa
cadeira após a catraca. Ele entra, senta, encosta a cabeça no vidro e dorme.
Deve descer no final, eu acho; por isso, fica tranquilo, sem medo de passar do
ponto. Como será a vida dele? Será que é casado? Será que tem filhos? A vida
dele pode ser de tantas formas, mas já que eu não sei como é, imagino.
Entretanto, se cada pessoa pudesse contar a sua história, eu encheria essa
folha e talvez outra, e outra…
Eu também tenho a minha
história. Será que alguém nesses três anos ao menos pensou nisso? Não sei
dizer, mas creio eu que sim.
São tantos rostos, e eu
já decorei todos, mas há sempre um novo, que por ventura saiu mais cedo ou mais
tarde de algum lugar, assim como acontece, às vezes, comigo, e me torno um
estranho para um monte de estranhos. Pelo menos neste ônibus, o meu rosto já é familiar:
sou um estranho conhecido de todos; isso não é engraçado e até mesmo triste?
Bem, já não importa tanto
o que sinto, mas sim o que vou sentir daqui por diante. Levanto-me do banco
onde estou sentado, olho para a frente, onde todos estão presos em seus mundos
particulares, puxo a corda, ouço o som da campainha solicitando a parada no
próximo ponto, e aguardo até que eu possa descer. Quando, por fim, o ônibus para,
olho mais uma vez em direção à frente do veículo: é um olhar cheio e vazio ao
mesmo tempo. São tantos significados que não consigo ao menos entendê-los… ou
me entender. Desço, feliz por um ciclo que se completa e triste por já estar
saudoso de uma história que deixo para trás, com o desejo vivo de poder seguir
minha vida, pois felizmente o que é bom não dura para sempre, assim como o que
não é também acaba. Digo felizmente no caso das coisas boas acabarem porque só elas
sendo da maneira que são aprendemos a olhá-las como elas merecem. Essa é mais
uma longa história de vida que fica para trás, ou talvez não, pois quem sabe a
minha história, nesta jornada da vida, solicite parada e desça no próximo
ponto, afinal de contas, na vida, até as histórias são passageiras.
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